segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Os sentidos da palavra


Dizem que escrever é um ato solitário. Solitário, mas não de solidão, pois o escrever dissipa a angústia da solitude a partir de esforços que fazemos para garimpar palavras que dão sentido e nexo às emoções.
William Shakespeare dizia: “é necessário dar palavras à sua tristeza, porque o pesar que não fala, endurece o coração já sofrido.” Quem nunca passou pela alegria de estar precisando falar e poder contar com alguém que lhe desse acolhimento, ouvindo-lhe atentamente? Troca de experiências e emoções humanas tira qualquer sofredor do sufoco. Há quem prefira o silêncio, mas são raras as pessoas que convivem bem com o recolhimento da dor em si mesmas sem que isso as desespere. A maioria de nós precisa falar, eu preciso muito!
A atriz Cissa Guimarães falou no Fantástico, dia 18, sobre a perda do seu filho Rafael que morreu atropelado em julho de 2010. Emocionada e emocionante, ela disse: “Não tenho como ir contra a minha dor, ela é enorme. Eu aceito, respeito e cuido dessa dor, assim abro espaço para a minha alegria conviver com ela.” Que bom ela poder expressar sua dor diante do mundo, uma dor enorme que transcendeu os limites da sua privacidade e, se falou é porque a necessidade de falar foi enorme também.
Mas, e quando não pudermos falar? Podemos escrever. Façamos a experiência; se a solidão quiser devorar o coração e não tivermos ninguém para nos ouvir, uma folha de papel em branco ou a tela de um computador vazia pode acolher nossa ansiedade e inquietação. Não precisamos ser escritores, pode ser até que nos tornemos um, mas, ao contarmos uma história, criando personagens, falando de seus amores e desilusões, perdas e medos, estaremos falando de nós mesmos. Pode ser até que seja a letra da música ou a poesia de uma vida, pode ser um diário...
Se somos totalmente sinceros, se inventamos ou fingimos ao escrever, não importa, as palavras podem estar nos abrindo portas para uma maior percepção do mundo e da vida.
Até o poeta Fernando Pessoa admitiu que precisava muito da palavra fingida para dar conta dos tsunamis que assolavam sua alma: “Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo. Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe ( se é esses outros). Sinto crenças que não tenho. Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas... Sinto-me vários seres. Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada, por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço”.
Se somos um ou muitos, aquele temor secreto, aquele trauma, aquela angústia que aperta o peito, as preocupações que nos afligem, as ondas gigantes que devastam a alma e os sonhos que sonhamos ou deixamos de sonhar precisam ganhar palavras para que o nosso coração já sofrido não enrijeça com o pesar que não se fala ou a história que não se conta.
Regina Gaiotto - reginagaiotto.blogspot.com
http://www.ube.org.br/biografias-detalhe.asp?ID=806

2 comentários:

  1. Regina, parabéns!!! É um texto para muitos lerem, a receita para aliviar muitas dores, deixa-las escorrer pelas pontas dos dedos... Quantos estão precisados!

    Muito bom, lindo, verdadeiro! Amei!

    Bjos, querida

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  2. Regina, sou também amiga da nossa querida Bel. Seu texto deu acalento ao meu coração. Eu estava precisando ler isto.

    Lindo, lindo, lindo...

    Obrigado por este momento!

    Bjs.

    Roseli

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