Um breve conto de amor
Era novidade. No pequeno vilarejo, todos queriam ver e falar da bela moça que chegara de trem ao entardecer.
Seu vestido longo e vermelho lembrava uma pintura rupestre. Rendas escondiam seu colo alvo, macio, exuberante.
Luvas curtas deixavam parte dos punhos à mostra e seu rosto,
escondido pelo véu transparente do chapéu claro lembrava um Modigliani; alongado,
olhos rasgados, tez clara.
Passeava pela cidade com a desenvoltura de quem sabia a que
viera.
Sua bagagem de mão, uma pequena frasqueira em couro prateada, com certeza guardava o frasco do suave perfume que exalava de seu corpo por
onde passava.
A passante de Charles Baudelaire talvez se aproximasse dela
com naturalidade, mas as mulheres e moças do vilarejo não se continham em
fofocas e maledicências.
Na hospedagem, a mulher se identificou e pediu para ocupar o
quarto 32. Pediu uma ligação local e logo um cavalheiro vestido de preto, com
chapéu vitoriano apareceu na recepção.
A mulher correu ao seu encontro e se abraçaram como se fosse
a última coisa que fariam na vida.
Passaram a noite no quarto 32 da hospedaria.
De manhã, o homem pediu nova ligação.
Um Ford preto do final do século
XIX, muito bem conservado veio para conduzir o misterioso casal. O chofer elegante cumprimentou a bela mulher que aguardava, sentada
em uma velha poltrona. Sua delicadeza e seu vestido vermelho contrastavam com o fundo escuro do couro; de seu rosto, coberto pelo véu, irradiava uma
luz intensa
A conta foi acertada pelo cavalheiro de chapéu vitoriano e
partiram em seguida.
A senhoria correu a chamar a camareira para irem ao quarto onde se hospedaram
os amantes.
Encontraram sobre a cama perfumada apenas uma pluma do chapéu e um bilhete que
dizia:
“Vocês são os mesmos que aqui ficaram quando
parti aos quinze anos, aves necrófagas que sobrevoam sobre as múmias de suas maldosas crenças e preconceitos.Neste quarto me hospedei quando parti pobre e melancólica. Muito chorei e aqui não mais voltarei."
Um perfume suave, misturado ao cheiro do amor da noite entorpeceu as duas mulheres que caíram
ao chão, desmaiadas, uma com o bilhete na mão, a outra com a pluma do chapéu sobre o coração.
Horas mais tarde, toda a cidade ficou sabendo do ocorrido.
Imagem : Fonte: Blog Memória Vintage.
Imagem : Fonte: Blog Memória Vintage.
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